Um dos propósitos mais nobres da EXPO 2015 de Milão, com suas dezenas de pavilhões nacionais, é proporcionar ao visitante que entra em cada um desses microcosmos uma viagem a um país distante.
Confesso que ainda não visitei todos os espaços dessa enorme festa, mesmo assim, não tenho dúvidas de que a nação que melhor desenvolveu essa ideia foi o Japão.

E não estou falando do pavilhão em si (o mais badalado da EXPO, e o mais bacana que visitei), mas da sacada excepcional de levar ao outro lado do mundo – ao menos por seis meses – um dos restaurantes mais tradicionais do Japão, o Minokichi.
Criado em Kyoto em 1716 (!!!), hoje em dia esse nome é uma referência absoluta de cozinha japonesa tradicional de altíssima qualidade, tendo dado origem a uma rede de restaurantes espalhados por todo o país (com casas em Tóquio, Osaka, Saitama, Chiba e Kanagawa).
Na casa provisória lombarda, a proposta é simples, mas imbatível: existem 3 opções de menu e uma extra para a hora do almoço. Trata-se basicamente de um menu-degustação com pratos de peixe, carne, sopas e doces. O sortudo comensal só precisa escolher o quanto quer gastar – e nunca é pouco: o menu do almoço, o mais barato, sai 80 euros sem bebida. O mais caro? 220 euros.
Sei que alguns vão dizer que é um exagero, uma coisa despropositada e tudo mais. Até alguns jornais italianos se esqueceram de falar da qualidade da comida (será que entenderem?) para encurtar a matéria e alardear simplesmente que aquele é o lugar mais caro da EXPO. É, sim, o lugar mais caro do evento, mas também a melhor experiência possível para qualquer um que queira ser realmente transportado para as entranhas da cultura gastronômica de um país tão fascinante como o Japão.

Ao entrar no recinto, silêncio. Uma simpática moça vestida impecavelmente com quimono me leva à sala principal. Ali, estão poucos clientes – uma meia dúzia de homens japoneses – e, do lado de lá do balcão, três senhores, vestidos inteiramente de branco e com um chapeuzinho da mesma cor. Por um instante, param de cortar peixes quase-vivos e me dão as boas-vindas.
Noto que um deles, o mais velho, fica particularmente surpreso ao ver entrar uma menina de olhinhos puxados que fala italiano e veio comer sozinha. Ele é o chef, Yoshihiko Horimoto (e atualmente comanda o Minokichi principal, em Tóquio).
E, mal chega minha Kirin Ichiban– sim, a menina estranha que come sozinha toma cerveja – o primeiro prato é delicadamente colocado na minha frente. “Zenzai”, o antepasto, com enguia cozida com pimenta-do-reino verde japonesa, rolinho de salmão e queijo cremoso, camarão grelhado, “foie gras gelatina” à la japonesa, omelete japonês e verduras temperadas com pasta de nozes. À primeira mordida, uma certeza – e um certo alívio –: estava no lugar certo e aquela refeição valeria cada centavo.

Depois, “Wanmono”, sopa. Aquela era de dashi – caldo de alga kombu e peixe seco – com um pedação de pargo frito dentro, cenoura, alga wakamame, gengibre e alho porró. É impressionante como uma coisa tão límpida e inocente pode conter tanta potência. Como dizia o sábio, de levantar defunto!

A seguir, o essencial: sashimi de vieiras, atum selado e pargo (foto do início do post).
E, logo depois, a brincadeira fica séria: um EXCEPCIONAL olho-de-boi marinado por um dia com molho yuanji (típico da região de Kyoto, feito com saquê doce, e inventado pelo criador da cerimonia do chá) e grelhado ao momento. A partir de então não consegui mais parar de sorrir.

Eis que chega, então, o melhor prato da degustação: bife de carne japonesa grelhada com molho teriyaki da casa, acompanhada de verduras e tomate grelhado com molho de missô.

Meus amigos, vocês não imaginam o que era esse molho teriyaki. Esqueçam tudo que leva esse nome; não merece ser chamado assim. E a carne? A melhor que já comi na vida. Parecia feita de manteiga. Juro que quase chorei quando dei a primeira garfada – ou melhor, “hashiada”.
Para começar a fechar com chave de ouro, sushi de enguia (que é e sempre será meu preferido), pargo com alga kombu e toro. Pequeno detalhe: nessa altura, o chef já estava rindo da minha cara; eu devia estar fazendo expressões muito peculiares porque ele olhava para mim, ria, e dizia: “arigatô”.

Depois, um missoshiro impecável, uma granita de chá verde com doce de feijão e um docinho (também de feijão; os japoneses são um pouco monotemáticos em se tratando de sobremesa)
para acompanhar o chá. Este, não tinha nada a ver com aqueles saquinhos suspeitos que compramos no supermercado; era um lindo pó verde-vivo que a minha garçonete preferida – a Keiko, que mora em Bologna e vai virar minha melhor amiga – preparou, literalmente, com toda a cerimônia.

Ao final de tudo isso, eu estava tão feliz que quis abraçar todos, tirar mil fotos e declarar minha emoção.
Resumindo, foi lindo. Me senti como se tivesse feito um bate-volta para Kyoto.
E contarei ansiosamente cada segundo até ir para lá de novo.
Adorei, Flora! De gente grande o seu comentário. Beijo, Zé Roberto.
Que honra receber seu comentário, querido Dr. Gusmão!
Fico muito feliz que tenha chegado aqui no meu blog e, claro, que tenha gostado do texto.
Espero que esteja tudo bem por aí
Um beijo enorme,
Flora.