Excelência e constância

Uma das melhores formas de efetivamente avaliar a qualidade de um restaurante é experimentá-lo algumas vezes. Como todos nós, pode ser que um dia o chef acorde com o pé errado e coloque mais sal do que deveria, erre o ponto de cozimento da lula, sirva um risoto meio seco e coisas do gênero.

É uma simples questão de probabilidade matemática: experimentando mais vezes, se um restaurante é bom, o acaso fica mais raro e a avaliação mais justa.

Pois bem, existe um restaurante em Bologna, ao qual fui aproximadamente umas 20 vezes desde que cheguei aqui, onde em todas elas comi excepcionalmente bem. Sei que parece exagero, mas garanto. O lugar se chama “Acqua Pazza” e, sem sombra de dúvidas, é o melhor restaurante de peixe que já experimentei (considerando Itália, Brasil e todos os outros lugares por onde passei).

Se eu tivesse que adivinhar seu segredo, apostaria todas as minhas fichas no seguinte palpite: a matéria prima é de altíssima qualidade e, sempre, muito fresca. Tanto é que ali é servido o melhor prato de crus e as melhores ostras que já provei – e repeti, e repeti… – e, claro, nesse caso o frescor e a qualidade da matéria prima são essenciais. (Ver o post sobre crus, aqui)

Crudo Acqua Pazza - Foto: Simone Tortini
Crudo Acqua Pazza

E não é para menos, os fornecedores do chef Francesco são localizados ao longo do litoral da Itália; basicamente, cada ingrediente provém do lugar onde oferece seu melhor: ostra vermelha de Gallipoli (Puglia), cernia (“mero”) e San Pietro (“peixe-galo” ou “alfaquim”, ou “são pedro”) de Lampedusa, na Sicilia; canocchie (não tem no Brasil; só dando um Google pra descobrir) de Cesenático (Emilia Romagna)…

Pesce Serra - a nossa Anchova, mas gigante e buonissimo!!!
Pesce Serra – a nossa Anchova, mas gigante e buonissimo!!!

Mais ainda, considerado o tamanho do homem e sua cara de bravo, se o que trouxerem não for muito fresco, o chef, não compra –  e ainda que faça parte do menu, não será servido naquele dia.

E, obviamente, a qualidade extrema dos ingredientes simplifica o trabalho na cozinha; bastam receitas simples, que valorizem o sabor essencial de cada um deles. Nesse sentido, até o nome do lugar remete a um modo quase elementar de preparação de peixes, mas que jamais falha: pesce all’acqua pazza é o peixe inteiro, normalmente no cartoccio, com batata, tomate, alho, vinho branco e ervas aromáticas, particularmente timo. E é exatamente assim que Francesco prepara os peixes do dia, apresentados quase vivos aos clientes, logo no início do jantar.

Fora os assados e crus, os primi piatti variam sempre, de acordo com a estação. Semana passada, comi spaghetti con zottoli (micro polvinhos, típicos de Chioggia, no Veneto, muito saborosos e que soltam um pouco da sua tinta quando cozidos). Um prato que, felizmente, não sai do cardápio e que vira uma obra prima nas mãos de Francesco é o risoto de frutos do mar, ou melhor, o prato de frutos do mar com um pouco de arroz misturado; a quantidade de vôngoles, mexilhões, camarões e lulas dentro do prato é algo jamais visto. É para comer de joelhos.

Risotto ai frutti di mare - Foto: @jogger1983
Risotto ai frutti di mare – Foto: @jogger1983

Obviamente, toda essa qualidade e riqueza custa. Normalmente, em uma refeição completa com vinho gasta-se em média 50 Euros por pessoa. E, claro, esse é um lugar indicado àqueles que realmente gostam de peixes e frutos do mar e que apreciam seu sabor puro – porque só assim se sente a diferença entre um peixe realmente fresco e um não tanto assim.

Resumindo, não é para todos os dias, mas, garanto, é para voltar sempre que der.

Acqua Pazza, Via Augusto Murri, 168, Bologna. (Para mais informações, clique aqui)

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